sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Quarta-Feira de Cinzas

Outro dia de insônia: a tristeza é realmente senhora. Do carnaval, agora, não restam nem as cinzas; só um resto de pó de confete, um último brilho de purpurina. Hoje lavei a colombina e o vermelho dos paetês desbotou, ficou quase com anemia. A tristeza dos paetês desbotados que eu coleciono desde criança, um dia eles vão para um quadro ou coisa assim. Olho minha colombina estendida no varal, ao lado da Carmem Miranda, da palhaça, da joaninha... da melancia não sobrou nenhum caroço... Lembro que não tem nem mais pierrô, nem arlequim, agora tudo é chato de novo, casa, faculdade, viajar e fazer comida... E uma espécie de marido pós-moderno. Tenho que expulsar os inquilinos da pensão do coração, agora o quarto tem que ser só pra um. Quem foi o muquirana que inventou a monogamia mesmo, hein?
Miss simpatia despede-se da faixa: volto a ser chata e ranzinza, ninguém mais pode olhar pra mim. O riso solto e fácil vai voltar pra cadeia de novo e ano que vem, se deus Baco quiser, irá ser solto – por uma semana e um pouco mais, graças a ele carnaval não é mais só quatro dias. Meu bando despede-se, debanda; nossos personagens que são tão, tão amigos no carnaval, agora quase nunca se encontram. Eu sou ovelha roxa de bolinha amarela, totalmente desgarrada. E volta-se a falar sobre as mesmas mazelas, o mesmo triste fim de Policarpo Quaresma.
Triste a vida ser a maior parte do ano quarta-feira de cinzas. Eu me escondi num pano de guardar confetes. Mas ainda tem um pouquinho de purpurina lá, bem no porão de mim.


Por Heleninha Berenguela

Um comentário:

Dana Wolfembrant disse...

Aplaudida por todos nosso não expectadores. Heleninha bem que podia virar beringela, para fazer parte de nossa hortalistica familia.
Bravo, bravissimo!